Democracia e eleições: para que serve propaganda eleitoral?
by Francisco on sexta-feira, 4 de agosto de 2006
José Luiz Ames
Nas democracias representativas ocidentais, o mecanismo eleitoral é o instrumento fundamental do exercício da soberania pelo povo. Nossa tradição democrática tem limitado, com raras exceções, o exercício do voto sobre candidatos e não sobre temas ou propostas. O problema que a existência de grandes aglomerados humanos levanta é como escolher dentre um vasto leque de candidatos aqueles que deverão representar o conjunto dos cidadãos. O mecanismo encontrado por nossos legisladores é o da instituição de um horário de propaganda eleitoral no rádio e na televisão. Imaginaram os legisladores que, desta maneira, cada candidato poderia se apresentar aos eleitores e discutir suas propostas. Qual é a impressão que o horário de propaganda eleitoral deixa?
O desfile de rostos e vozes através da propaganda eleitoral na TV e no rádio deixa uma sensação de desespero. É como se estivessem pedindo socorro à beira de um abismo. Voz e olhar são de súplica. Nos dez a quinze segundos que cada candidato dispõe, ele consegue dizer o seu nome, seu número, pedir o voto para si e pronunciar mais três a quatro palavras soltas. Ultimamente, exigiram deles ainda que durante os poucos segundos pedissem voto ao seu candidato ao cargo majoritário!
É preciso admitir que é difícil escolher alguém a partir do que se ouve e vê na propaganda eleitoral. Ao menos não em base ao que deveria ser o critério da decisão: as propostas dos candidatos. E por uma razão óbvia: ninguém apresenta propostas. As palavras soltas que se ouvem (“mais creches”, “mais saúde”, “mais educação”, “mais segurança”, etc.) são absolutamente inúteis para estabelecer um juízo.
Submeter candidatos à semelhante vexame é um insulto à decência. O eleitor fica com a impressão de que são todos ocos de propostas simplesmente porque o tempo de que dispõem não lhes permite dizer sequer uma frase completa com sentido. Os dois comportamentos mais freqüentes em relação ao horário da propaganda eleitoral que podem ser constatados, ambos inadequados dada a importância do evento, têm sido estes: desligar o rádio ou a TV durante os minutos do programa; ou manter os aparelhos ligados para fazer chacota das figuras que desfilam. Alguns, e me incluo entre eles, mantêm os aparelhos ligados, não para satisfazer a vontade de zombar, mas levados por um sentimento de tristeza: cada um diz que é amigo, que o conhecemos e quer nossa ajuda. Como não sabemos de que maneira podemos ajudar a todos e como não conseguimos escolher um preferido, nos deprimimos diante da nossa impotência.
Considero que a propaganda eleitoral no rádio e na TV, nos moldes atuais, é inútil para a finalidade para a qual foi criada. É vexatória para os candidatos e motivo de irritação para os eleitores. Nada acrescenta à formação do espírito de cidadania. Urge pensar um formato que permita a cada candidato dizer o que pensa e apresentar o que pretende, mesmo que, para tanto, possa fazer uma única aparição em todo período de propaganda eleitoral.
* José Luiz Ames é doutor em Filosofia e professor da Unioeste/campus de Toledo.