José Luiz Ames
Tomás de Aquino nasceu no reino de Nápoles, Itália, em 1225 e morreu em 1274 a caminho do Concílio de Lyon, ao qual fora chamado pelo papa Gregório X. Membro da ordem dos beneditinos, é o mais conhecido teólogo e filósofo da Igreja Católica. Sua característica mais marcante é ter assimilado o pensamento de Aristóteles e aplicado ao pensamento filosófico e teológico.
O tema da política é abordado por Tomás em vários escritos. Dentre estes, destaca-se a obra “Do Reino” a partir da qual vamos tecer algumas reflexões. A política em Tomás tem um conteúdo ético. Está subordinada a valores transcendentes e se ordena ao bem comum. Os bens particulares devem ser ordenados ao bem comum, sejam eles as riquezas, a erudição ou a eloqüência.
O que caracteriza a existência de uma vida política voltada para a realização do bem comum? Para Tomás, a existência de duas ordens de coisas. A primeira, uma estrutura jurídica que assegure a paz e possibilite levar uma vida virtuosa. A segunda, serviços prestados à coletividade por meio dos governantes. É obrigação dos governantes instaurar uma vida boa, conservá-la e melhorá-la.
O bem comum terreno assegurado pelo governante está ordenado à bem-aventurança eterna. O fim último da vida em comunidade não é viver segundo a virtude, mas sim pela vida virtuosa chegar à vida eterna. Em outras palavras, o Estado não é o fim último. É apenas um meio, ainda que imprescindível, para alcançar a felicidade eterna.
A concepção política de Tomás de Aquino nos ensina duas lições fundamentais. A primeira é que não pode existir um bem particular que não esteja em função da coletividade. Por exemplo, o conhecimento que um indivíduo possui só é legítimo se ele for colocado a serviço de todos. Eu não estudo para mim, por um prazer solitário do meu espírito. Eu estudo para melhorar a vida de todos. Só isso já é uma crítica severíssima contra aqueles profissionais, estudantes e professores que não se consideram obrigados a devolver para a sociedade a ciência adquirida. A mesma crítica se aplica à idéia de propriedade particular. Tomás de Aquino jamais admitiria que um indivíduo possuísse mais do que necessita para sua própria subsistência. Toda acumulação de bens que possibilita o usufruto do supérfluo e uma vida sem trabalho é um roubo do direito de outros levarem uma vida digna. Na linguagem de hoje, podemos dizer que para Tomás a propriedade tem uma “função social”.
A segunda lição é que o Estado não é a verdade última do homem na face da terra. O homem está destinado à realização de finalidades superiores do que aquelas que o Estado é capaz de assegurar. Quer dizer, a finalidade da existência humana não se esgota com a realização de todas as necessidades materiais. O homem tem uma abertura para o Absoluto e essa busca é uma sede infinita e infinda. Essa idéia de Tomás é uma violenta crítica aos nossos governantes, que sequer são capazes de assegurar a realização das necessidades materiais. Pode o cidadão desobedecer legitimamente ao governante que não cumpre sua obrigação de zelar pelo bem comum? É o tema do direito à revolução que examinaremos na próxima reflexão.
*José Luiz Ames é doutor em Filosofia e professor da UNIOESTE, Campus de Toledo.