Teologia da Libertação [Estudos e Pesquisas em Filosofia & Teologia]
by Francisco on sexta-feira, 18 de março de 2011
por Francisco Antônio de Andrade Filho
Neste ano 2011, O Recado da Pesquisa comemora seus 12 anos de vida. Manteve-se firme e coerente na divulgação de estudos e pesquisas em Filosofia integrada com outros saberes humanos. Nesta edição, e em sua homenagem, convidamos nossos amigos internautas- de modo especial os amantes da Teologia Latino-Americana da Libertação -, para um diálogo construtivo neste ciberespaço. Façam seus comentários. Bem-Vindos!
Era década de 1960. A América Latina tomava consciência de sua dependência econômica, política e religiosa. Desencadeava-se um processo de libertação nos diversos segmentos da sociedade. A Igreja, à luz da Revelação inserida na linguagem histórica, pesquisava uma nova práxis da fé cristã, que fosse fator de transformação e de libertação. Exigia-se uma nova prática evangelizadora. Surgia um novo tempo de inteligência de fé, uma reflexão sobre os compromissos assumidos pelos cristãos em situação revolucionária. Era a Teologia Latino-Americana de Libertação. Nascia com aqueles cristãos que, no interior dos movimentos operários e universitários comprometidos com as camadas populares, tentaram pensar sua fé e o Evangelho à luz das práticas libertárias, postulando uma sociedade diferente.
Tradicionalmente, a Teologia tem sido definida como a ciência que elabora racionalmente verdades de fé procurando compreendê-las sistematicamente e tirar delas novas conclusões. É “sabedoria” racional. É pesquisar Deus de uma maneira acadêmica e a- histórica.
Hoje, a Teologia é reflexão crítica das situações históricas concretas. É “ato segundo”. Nasce da prática. A teoria vem depois. O ato primeiro é compromisso com os pobres, com sua vida, com seus sentimentos. Vinda depois, a Teologia é uma reflexão que supõe o ato primeiro do compromisso libertador do homem que é história. Não é discurso vazio, inacreditável, mistificador. Não “(des)realiza” as contradições concretas. Não aliena o homem com frases fantasmática deste mundo.
Nesta linha de pensamento desfilam os melhores teólogos de libertação. O mais conhecido e censurado - em nome de Cristo pela nova Inquisição de Roma -, é Frei Leonardo Boff, seguido por Márcio F. dos Santos, José Oscar Beoso, Benedito Ferrari, Frei Beto e outros. Todos eles pensam Cristo “encarnado para evangelizar os pobres e anunciar aos cativos a libertação” (Lc.4, 18 – 20). São pesquisadores de Deus na História, intérpretes de uma Igreja comprometida com os caminhos dos oprimidos, solidários com seus anseios de promoção humana e de libertação. Todos eles pretendem pensar não a partir do tema da libertação, mas a partir de uma prática de libertação concreta junto com os interessados por esse processo. A partir da prática, muda a maneira desse pensar a tarefa da teologia.
A tarefa de semelhante estudo da revelação divina é libertar a teologia de certo tipo de “teologia universalizante” e ideologizada, ligada a uma prática da fé sem crítica de seus pressupostos econômicos, políticos e religiosos. É a função “desideologizadora” da Teologia Latino-Americana da Libertação. Ela tenta, também, articular uma leitura da realidade a partir dos pobres, e no interesse de sua libertação.
Encarada assim, por que temer a Teologia da Libertação? Fiquem tranqüilos os paranóicos da Teologia, paranóicos esses empresários da sua ganância de lucro socialista e capitalista, defensores de uma teologia que se presta a legitimar as práticas de acumulação à custa do depauperamento do operariado. Paranóicos, essas pessoas que não estão interessadas em mudar a forma de convivência social porque correriam risco de perder suas benesses e o lugar privilegiado que ocupam na sociedade. Paranóicos, esses cristãos – leigos, padres, pastores, monsenhores, cardeais, papas e outros poderes sacros -, habituados a uma versão intimista e meramente piedosa da fé cristã: a fé é para salvar só a alma e garantir ao indivíduo a eternidade feliz.
Para seus comentários e debates: Por que temer a libertação de Cristo ser realizando em fatos históricos e políticos libertadores? Por que não se pensar Deus presente na luta dos homens que procuram mais justiça sem a violência das armas? Sem as guerras, competições e conflitos entre religiões?
Não é possível libertar os homens enquanto eles não estiverem completamente aptos a fornecer-se de comida e bebida, a satisfazer suas necessidades de alojamento e vestuário em qualidade e quantidades perfeitas. Não é possível levar a cabo uma libertação real sem ser no mundo real e através de meios reais. A libertação é um fato histórico e não um fato intelectual, e provocado por condições históricas.
A Bíblia é a fonte por excelência que nos revela esta libertação histórica. Não é preciso ler Marx para entendê-la e interpretar a vontade de Deus. No Antigo Testamento (Ex 3,8), Deus é sensível ao grito do oprimido, toma partido contra o faraó e se decide pela libertação dos oprimidos. E conta São Mateus (7, 37): “Jesus fez bem todas as coisas; fez surdos ouvir e mudos falar”. Libertou-os. Sem essa prática, ninguém se salva (Mt, 25). É o culto que agrada a Deus (Is. 1,17).
Para mais estudos e pesquisas bibliográficas:
ANDRADE FILHO, Francisco Antônio de. Igreja e Ideologia na América Latina. Paulinas, São Paulo, 1982.
BOFF, Leonardo. Da Libertação. O teólogo das libertações sócio-históricas. Vozes, Petrópolis, 1979.