Por um Novo Projeto Político – Diálogo de Montesquieu no encontro do Ágora da Democracia

by Francisco on quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

por Francisco Antônio de Andrade Filho



 






“As leis, no seu sentido mais amplo, são relações necessárias que derivam da natureza das coisas.” (Montesquieu, “Espírito das Leis”, p.25)


 




No próximo dia 01 de janeiro de 2011, Dilma Rousseff assume o poder de Presidenta da Republica do Brasil. A soberania popular garantiu-lhe essa vitória. Anuncia-se um novo tempo de um Brasil cada vez forte e soberano. A reforma política será um dos pilhares para se produzir uma nova ordem constitucional, de uma Democracia com mais justiça social.

Nessa linha, a equipe do Recado da Pesquisa promove seu III Encontro no Ágora da Democracia, a ser realizado neste site a partir do dia da posse daquela primeira Mulher Presidenta da Republica do Brasil. Desta vez, no intuito de contribuir com o debate sobre reforma política – e motivar autoridades políticas -, proponho a temática: “Por um novo projeto político – Diálogo de Montesquieu no Ágora da Democracia’. Será uma fonte de inspiração para os representantes do Povo Brasileiro no Congresso Nacional, nos Estados da Federação, nas cidades em todos os recantos de nossa querida Pátria.


RESUMO DA PROPOSTA

Objetiva-se determinar as questões de ética e direito no saber filosófico de Montesquieu interligado com a Ciência Jurídica na História moderna, do século XVIII. Trata-se de buscar a fundamentação jusfilosófica da Ética e dos Direitos Civis, Sociais e Econômicos nas obras clássicas deste enciclopedista francês. Com ele, pensar as leis e os costumes, “como coisas necessárias que derivam da natureza das coisas” e, a partir daí, descobrir a racionalidade da Ética e dos Direitos Humanos.


INTRODUÇÃO

Charles Luis de Secondat, Barão de Montesquieu (1689-1755) é filho de uma época em que se inaugura uma nova forma de pensar e de agir do homem. Foi no Iluminismo do século XVIII, na França. Tempo de modernidade, do pensar livre e incondicional na razão, nessa inteligibilidade inerente à natureza e à própria realidade histórica. De um prodigioso desenvolvimento científico e cultural nascia uma nova postura de mundo, um brotar novo das idéias dos filósofos, da relação do homem com a natureza, entre o homem e o real, do ser natural e do ser histórico, na criação de novos valores morais e éticos, reconhecidos no novo desenho das razões e articulados entre o político e o social; entre a liberdade subjetiva e a sociedade civil; religiosa e outras instituições culturais da história humana.

Ao produzir um saber filosófico baseado no princípio da experiência dos sentidos como algo importante e seguro para se chegar à verdade - como pensar que se caracteriza pelo interrogar metódico da “natureza das coisas” - Montesquieu ocupa uma posição crítica entre o novo e o tradicional. Examinando os estudos teóricos experimentais realizados pelos pensadores clássicos da filosofia política, contemporâneos a Montesquieu, encontra-se a base para sustentar o desenvolvimento dessa pesquisa. Ele supera o jusnaturalismo de um Ugo Grózio (1583-1654), ou o de um Thomas Hobbes (1588-1679) ou aquelas outras fontes de pesquisa realizada por Jonh Locke (1632-1704), de uma Filosofia do Direito no “Tratado Teológico-político”e na “Ética” de Baruch Spinoza (1632-1677).

Montesquieu adota um conceito de “lei científica” (lei-relação) nas Ciências Humanas. Pensa o Direito. Pensa a História. Observa os costumes sociais, a ética e o direito dos regimes de governo do Estado moderno. Cria o modelo das Cartas Constitucionais. Pensa a sociedade como resultado da racionalidade humana no processo histórico.

Com isso pretende-se colocar em discussão os “princípios de ética e direitos civis, sociais e econômicos” na modernidade. A exemplo de outros filósofos do Iluminismo francês, século XVIII, de Denis Diderot, Jean D’Alenbert e Jean Jacques Rousseau, entre outros enciclopedistas, Montesquieu produz um saber filosófico intimamente relacionado com as Ciências Jurídicas na História. Em suas obras primas “Cartas Persas” (1721) e o “Espírito das Leis” (1748), entre outras, Montesquieu pensa a ética e o direito.

A antropologia jusfilosófica de Montesquieu não parte das essências de uma sociedade em geral, mas da realidade das práticas de todas as sociedades concretas da história. Cria um novo método de produzir o saber crítico-filosófico como um momento do saber jurídico, brotados das grandes revoluções científicas daquele tempo moderno. Faz da observação o princípio a partir do qual toda e qualquer ação humana - suas leis, valores, costumes, liberdade, moral, religião, direitos humanos, ética, política - deve ser julgada e compreendida à luz da razão, mesmo quando se defronta com o humanismo social, colocando a religião e moral dentro dos fatos da história, mantê-la à mesma ciência moderna: a lei-relação.


HIPÓTESE DE TRABALHO

Parece que o projeto filosófico de Montesquieu, em sua relação racional com as diversas ciências de seu tempo moderno, elege o homem como objeto de seu pensar. Parece produzir uma antropologia jusfilosófica a partir da observação dos princípios das “leis naturais”, dos PRINCÍPIOS DE ÉTICA E DE DIREITOS CIVIS, SOCIAIS E ECONÔMICOS. E escreve:

“Coloquei princípios e vi os casos particulares submeterem-se como por si mesmos, as histórias de todas nações serem apenas seqüências e cada lei particular ligada a outra lei, ou depender de outra mais geral (...) Não extraí meus princípios de meus preconceitos mas da natureza das coisas” (Montesquieu, E.L. Prefácio, p. 19).

No Livro Primeiro, cap. II, p. 26 e 27, do “Espírito das Leis”, Montesquieu argumenta que “é preciso considerar o homem antes do estabelecimento das sociedades” para se perceber as “leis da natureza” como princípios da concepção moderna do homem. Das leis naturais, as sociedades concretas construiriam seus valores morais, éticos e direitos humanos. Nessa perspectiva se encontra o núcleo central da hipótese deste projeto integrado de pesquisa..

Segundo Montesquieu, a primeira “lei natural seria a paz”, com a qual os “homens selvagens” na busca do “seu ser antes de procurar sua origem” não destruiriam uma “vida feliz na paz”. A “segunda lei natural seria a que o incitaria a procurar alimentos”, por força mesmo de sua “fraqueza e de suas necessidades”. Os homens e mulheres levados ainda pelo medo ou prazer, atraídos pelo encanto dos sexos da mesma espécie, “e o pedido natural que sempre fazem um ao outro seria uma terceira lei”. No entanto, na mesma dimensão e por sua especificidade, o homem não é apenas um animal; tem a capacidade de “ter conhecimentos”. Pois, segundo Montesquieu, os homens “possuem um segundo liame que os outros animais não têm. Existe, portanto, um novo motivo para se unirem, e o desejo de viver em sociedade constitui a quarta lei natural”.


Da investigação dessas quatro leis naturais se descobre quatro PRINCÍPIOS DE ÉTICA E DIREITOS HUMANOS na crítica de Montesquieu à sociedade do século XVIII. Eis aqui o fio condutor da hipótese desse projeto de pesquisa: a paz entre os homens, a procura de alimentos, o encanto da amizade na prática da sexualidade e o acesso aos bens culturais - direitos de cidadania no “desejo de viver em sociedade” - “leis naturais”, agora, no projeto - pesquisa, pensadas como princípios de ética e direitos civis, sociais e econômicos em Montesquieu, de uma atividade da razão humana que se defronta com a totalidade do ser, do homem, da política, da religião, da história, dos valores morais e éticos, entre outras questões jusfilosóficas da justiça e da lei. Nessa linha, a hipótese da proposta de pesquisa se manifesta de suma importância para a compreensão do mundo de hoje em sua “globalização”: destruição da vida ética, violação dos direitos humanos; violência institucionalizada, crimes ecológicos entre outras problemáticas a seguir justificadas.


JUSTIFICAÇÃO

A razão primeira - e pensa-se a maior - desta proposta de pesquisa, se revela no próprio ponto de partida de Montesquieu: o estabelecimento dos princípios ontológicos fundamentais, das “leis naturais” pensados em confronto com as contradições e limites da modernidade, de um mundo histórico, social, político e de outros processos culturais da experiência humana.

Essa perspectiva incita os pesquisadores dos Departamentos de Filosofia, de Ciências Jurídicas e de História a discutirem as obras de Montesquieu em suas questões vitais: princípios morais e éticos dos regimes políticos, do humanismo cristão, do conceito de lei, etc..

A pesquisa integrada interessa, nesses termos, às Universidades – de modo especial nos Departamento de Filosofia que em seu projeto pedagógico, escolhe “eixos temáticos”, da Ética e da Antropologia como diretrizes do ensino, pesquisa e extensão, não tanto como produto do saber sem alma, sem “espírito”, mas como processo de aquisição constante da formação ética e antropológica do corpo docente e discente do Curso em questão. A partir dessa “filosofia prática”, do estudo e da pesquisa do pensamento montesquieuniano, que problemática se pode elaborar com relação à formação direcionada para habilidades profissionais, de valores humanos, religiosos a serviço do bem comum? Que discussão se pode fazer para se observar e refletir os problemas políticos e econômicos em meio à corrupção generalizada do Poder Público do país?

Neste mesmo sentido, numa coerência prática nos seu projeto pedagógicos, trabalho norteado pelas Universidades brasileiras, para contribuirem “na formação de pesquisadores no âmbito acadêmico, como na construção de uma cidadania, consciente de seus valores éticos de direitos humanos”.

O objeto do jurídico é interdisciplinar por ser alvo de estudo concomitante de todas essas ciências. Ao explicar que forma e conteúdo jurídicos são no mundo fático indissociáveis, as atitudes arraigadas e de auto-suficiência, sejam de formalismo, sociologismo, ou filosofismo é que, na verdade são fictícias, pois no mundo jurídico real forma e conteúdo não se separam. Observe-se que se é possível dizer, como o faz Souto, que as ciências jurídicas básicas não se opõem e não possuem fronteiras rígidas e ainda, se tais saberes em seu conjunto constituem uma unidade científica fundamentalmente harmônica colimando no vicejar da verdadeira teoria jurídica, é lícito dizer que este insigne professor propôs, ainda que de maneira implícita, uma teoria jus-tecnológica, ou seja, uma teoria do controle e análise do homem, de seu comportamento em seu convívio social, de suas reações aos preceitos normativos estatais formais e não formais. Isso nos parece ficar mais claro ainda quando trazemos à memória o seu ensinamento pugnando que, em época caracterizada pelo avanço da ciência e da tecnologia, não se poderia nominar de direito um fenômeno social com a prescindência de dados e mecanismos ofertados pela tecnologia.

A modernidade como entendemos hoje se constitui a partir dos fins do século XVII inteiramente associada ao conceito cristão de história, se seguirmos essa trilha perceberemos uma profunda preocupação dos pensadores dos séculos XVII e XVIII em estabelecer critérios claros em suas obras a respeito do que seria um Estado Cristão. Para eles era necessário associar os ventos de mudanças, que sopravam da Europa, à moral, valores e concepções cristãs construídas atentamente durante séculos. No que se refere a pensadores como Thomas Hobbes, Jean Jacques Rousseau sentimos como que deslocado do contexto central de suas obras a definição acerca do que deveria ser chamado de Estado Cristão; é quase uma satisfação que se dá a sociedade, é um passado tremendamente incômodo que se deseja readequar.

Quando tomamos as obras de Montesquieu percebemos que não é necessário construir artifícios, ele é capaz de redimensionar a questão religiosa; percebemos que a questão da moral, ética e direitos humanos e até, porque não dizer o sentimento religioso, se redefiniu perfeitamente à ordem da modernidade. É a idéia de lei-relação, é racional, é produto do homem em ação de sua práxis. Não o homem selvagem, mas aquele que percebe a dimensão do bem comum e que deseja construir um Estado onde deve estar associado o desejo do progresso material, porém respeitando os valores mais caros a civilização cristã.


Seus princípios éticos e morais construíram-se numa relação interna entre o geral e o particular. Percebe de forma incisiva a importância do particular, a história dos povos suas especificidades e pede em cada linha do “Espírito das Leis” respeito por essas características ou o caráter individualizado das civilizações sem, no entanto, abandonar uma concepção geral que poderia ser definida como princípios inerentes a todos os povos que seriam norteadores para buscar uma compreensão dos direitos humanos e da justiça social.

Montesquieu desenvolve um método para produzir um saber crítico sobre a história e a sociedade. Se seguirmos a trilha deixada pelo “Espírito das Leis” é possível inferir que Montesquieu antes de Karl Marx e Augusto Comte defende um status de ciência para a História e a Sociologia.


Estudar a inserção do pensamento de Montesquieu no universo das ciências humanas, de forma geral não poderia deixar de ser mais oportuno, pois percebe-se que foi na simetria do solitário pensador francês do século XVIII que colheram os pensadores responsáveis pelas grandes teorias do século seguinte, que mudaram a face da humanidade.

A realidade do tempo de Montesquieu aponta para profundas mudanças no que diz respeito à economia, estudo da sociedade, valores, etc.. Ele, com bastante lucidez, consegue perceber a necessidade da moderação para que não se percam as conquistas do passado e ao mesmo tempo se possa celebrar a modernidade ampliando os horizontes no que diz respeito a conquista da cidadania e dos direitos humanos. É justamente dentro da relação íntima entre a História, a Filosofia e o Direito que poderemos compreender os fundamentos que são os norteadores do novo Estado que emerge com a burguesia, e como são articulados na obra de Montesquieu os anseios que já no seu tempo são tão caros aos desprivilegiados da paz, da vida com qualidade, numa convivência social que seja permeada pela justiça.

Na verdade, a filosofia de Montesquieu é produzida na História, tecida com os traços culturais do tempo moderno. Sua tarefa não se restringiu apenas em observar “fatos” históricos, mas com eles pensar o século XVIII, refletir as sociedades concretas desta época. Na interpretação de Louis Althusser:

“Tal é a descoberta de Montesquieu: não consiste em habilidades e pormenores, mas no estabelecimento de princípios universais que permitem a inteligência de toda história humana e de todos os pormenores desta” (Louis Althusser “Montesquieu”: A Política e a História, p. 57, grifou-se).

Assim, num mesmo procedimento metodológico de Montesquieu, de observar a realidade histórica, a “Dialética da História”, como processo dinâmico da “lei-relação”, os pesquisadores do Departamento de História investigarão as variações dos “fatos” do século XVIII conectadas com o cultivar jusfilosófico de Montesquieu e refletido de modo integrado com os pesquisadores dos outros dois departamentos (Filosofia e Ciências Jurídicas), da Universidade Católica de Pernambuco.

A disciplina, Filosofia do Direito, do Departamento de Ciências Jurídicas, contém um programa que leva a um estudo ontológico do Direito, a pesquisa de seus elementos universais e necessários, da pesquisa axiológica, norteada por princípios éticos e de direitos humanos. Pensa-se ser esta uma tarefa retroalimentadora para a referida disciplina, e enriquecedora da produção do saber jurídico moderno.


OBJETIVOS

Pretende-se ainda atingir os seguintes objetivos específicos:

a) pôr em prática os objetivos dos cursos envolvidos, estimulando os alunos no domínio da leitura, análise e compreensão das obras filosóficas, jurídicas e de história, de formação científica, ética e humanista;

b) estender os resultados da pesquisa a serviço da sociedade civil e suas organizações institucionais na defesa da ética e dos direitos humanos;


METODOLOGIA

O projeto terá por base a análise interpretativa (hermenêutica) exegética dos textos principais, próprios de Montesquieu, e de outras fontes de apoio na compreensão de seus postulados, numa perspectiva dedutiva daqueles PRINCÍPIOS DE ÉTICA E DIREITOS HUMANOS, imanentes àquelas obras citadas. Essa postura vai permitir se ver o social, o político e as leis como um pensar humano em suas existências concretas na história, inclusive descobrir os valores das “leis religiosas” constituintes de seu humanismo ético cristão. Isso implica dizer que o procedimento metodológico desta pesquisa se constituirá o todo - as relações entre os costumes (Cartas Persas), as leis políticas, civis e religiosas, isto é, as particularidades (lei relação) com a universalidade do ser humano.

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