por Francisco Antônio de Andrade Filho
Tancredo de Almeida Neves, José Sarney e a CNBB dispersaram as massas. Escorados em suas armas de comando, desintegraram-nas com promessa de uma Assembléia Nacional Constituinte. Temeram o Povo.
A Mensagem nº 343/85 e a Emenda Constitucional nº 26/85, José Sarney convocou a Assembléia Nacional Constituinte. Dois anos mais tarde, em 01/02/1987, com os discursos de instalação e posse do evento, do Presidente do Supremo Federal José Carlos Moreira Alves; o Deputado Ulisses Guimarães foi eleito Presidente da Constituinte.
Sob a égide da modernidade, evocada na tradição, os representantes políticos e eclesiásticos garantiram uma nova constituição. Quais imperadores e inimigos das massas, eles se denominaram tutores da soberania popular. Garantiram às multidões substituir o caos jurídico-institucional da velha constituição, imposta em 1969 pela Junta Militar do regime autoritário.
Para essa elite política, parecia fácil derrotar a concentração do poder e da renda – corrosão dos valores básicos -, tudo isso substituído por uma nova constituição. Nascia um novo império camuflado no projeto político, defensor das liberdades democráticas e conquistas sociais almejadas por todos os “brasileiros e brasileiras”.
A CNBB não se omitiu ao acontecimento. Pois, seu Presidente, Dom Ivo Lorscheiter, em 31 de janeiro de 1987, véspera da instalação do evento constituinte, falou: ”O momento político em que vivemos é de transição...”. Inserida na História, a Igreja é o mundo dos homens, com os mesmos desejos de mando na liberdade do outro. Por mimese, fala a linguagem dos políticos. Ameaçada, teme as massas.
As colunas do Trono e do Altar se associam, instaladas na Assembléia Nacional Constituinte. Assim, na Catedral de Brasília, o Presidente da CNBB evoca a proteção divina e o respeito aos ditames da reta consciência à lei de Deus. E dita: “O nome de Deus presidirá, então, não apenas o texto escrito, mas a organização concreta da sociedade brasileira e a vida do povo”.
Foi nessa época que, naquele mesmo templo religioso, o “Te Deum Laudamus” é entoado, uníssono, com o “Hino Nacional” no Congresso. Deslocado, cheio de louvores, em Latim e em Português, Deus não mais detesta a tirania, nem desaprova aos tiranos. É que a CNBB sentou-se no “Plenário Pró-Participação Popular na Constituinte” para a politicalha, da burguesia brasileira ser protegida e abençoada por Deus. Objetiva-se com isso, escrever a lei da Democracia impossível, enquanto governo da ganância do capital e (des)governo do trabalho.
Para tanto, lenta e sorrateiramente, a Igreja se movimenta em direção ao povo. Fala. Escreve. Ora. Age para não ser tocada nem fisgada pela massa Sabe que, ao destruir diferenças e aniquilar “Hierarquias firmemente estabelecidas, na conquista da igualdade com o outro, a massa popular se volta contra ordens tradicionais – quer políticas, econômicas, filosóficas ou religiosas -, “já não se conforma com condições e promessas piedosas”.
Na expressão de Elias Canetti, é “o perigo”, a paranóia dos que mandam, rondando na igualdade das multidões, que não distinguem nem superior, nem súdito; nem Presidente, nem deputados e senadores; nem Papa, nem CNBB e nem leigos. As massas querem experimentar por si mesmas o sentimento supremo de sua potência e de sua paixão selvagens.